quinta-feira, 20 de março de 2008

Passado...!

Deitei-me, mais uma vez, a desejar o que não tenho.

Adormeci a pensar que quero o que não tenho apenas porque não tenho.
Adormeci relaxada, consciente de que era só um capricho. E que não passava disso. Senti-me bem por conseguir controlar bem o que sinto e quero. Senti-me bem por ver que, mais uma vez, eu tinha razão e não desejo nem gosto daquilo que quero. Simplesmente quero.



Fui a uma espécie de mini-concerto com uma amiga que nunca tinha visto. A banda que eu não conhecia levou milhares de pessoas à loucura. Parecia que esperavam por aquele concerto há tantos anos quantos duravam as suas vidas.
O concerto baseou-se num pequeno medley de hits que não me diziam nada.
No fim do concerto, pelo gozo de coleccionar, eu e essa amiga fomos à caça dos autógrafos. Não conseguimos, os membros da banda tinham desaparecido. Ninguém percebeu nem como, nem porquê.
Estavam umas casas de banho ali perto, aproveitamos. Eu e a minha amiga que eu não conhecia.
Não me lembro bem da conversa. Mas sei que acabou com um "Tens jeito para as crianças! Já alguma vez pensaste em ser mãe?" vindo dessa tal amiga, na minha direcção. Acho que naquele momento fui atacada por um imenso instinto maternal e sorri com todos os sorrisos que em mim existem.
Continuámos a andar.
Eu vi um banco de jardim e fui sentar-me um pouco.
Estava calor, e ao lado do banco marcava o seu lugar uma árvore enorme, fantástica, acho que nunca vi uma igual. Ela aceitou-me na sua sombra.
Essa minha amiga ficou um pouco distante, estava ao telemóvel.
Com quem? Não faço ideia...
Deixei-me estar num sítio que me pareceu ideal, sentia-me lindamente, tudo estava a correr bem. Muito bem.
Pouco depois avistei os meus pais ao fundo da rua. Vinham os dois vestidos de preto, não é costume. Quando lhes sorri, com um sorriso feliz de quem se sente maravilhosamente bem, eles continuaram sérios a olhar-me nos olhos, enquanto continuavam a andar na minha direcção.
A minha amiga, que eu nunca tinha visto, veio de novo para perto de mim, ela também vinha séria.
Os meus pais ficaram parados a uns quantos passos de mim, olharam para a minha amiga, que eu não conhecia, e acenaram-lhe com a cabeça. Nunca alterando as suas feições.
Não fazia a mínima ideia do que se passava ali.
Então ela começou a falar, baixinho.
"Foi o João que me ligou, ele estava a ver na televisão umas notícias sobre explosões em Lisboa..." Eu não sei quem é o João, mas na altura deu-me a sensação que o conhecia.
"E caiu uma bomba na Portela.. O João estava na Portela..."
E eu perguntei a medo "Ele morreu?"
"Morreu. Ele e os que estavam com ele." Fiquei com pena do João, apesar de não o conhecer.
"Quem é que estava com ele?" Por esta altura íamos a caminhar ao longo de uma rua que eu também não conhecia, mas imaginei que ela conhecesse aquele caminho.
"O Pedro..." Continuávamos a andar.
"O David..." Ainda caminhávamos.

"O Ricardo..." E eu senti o meu coração parar.

Deixei de andar para cair de joelhos no chão. Queria gritar e nem isso conseguia, o meu peito doía-me mais do que alguma vez doera, chorava por todas as vezes que não chorei... Vi a minha mãe começar a chorar também e encostar a cara ao ombro do meu pai, que a abraçou.
Eu só pensava "Porquê?", e quanto mais me lembrava dele, e de tudo, mais chorava.



Acordei lavada em lágrimas, com um grito mudo preso na garganta.
Em dois segundos parei de chorar e pensei "que estupidez!", mas voltei a chorar depois de pensar no sonho que tinha tido.
Fiquei sentada na cama, revoltada.

Não vou questionar o que sinto. Sei bem o que sinto.
Mas nesta altura questiono o que senti.

Que merda...!

1 comentário:

Balbino disse...

Estás a mudar o estilo de escrita. Um realismo objectivo, previsível. Gosto de saber que não te ficas pelos versos. (odeio poesia e não aturo o Pessoa)